A noite madrilenha guarda sempre um ar de mistério, e naquela noite o destino tinha preparado algo especial e diferente. Ao chegar, a zona de Bachata da Ermita vibrava como em tantas outras noites, e eu procurava perder-me entre compassos e sorrisos alheios. Enquanto dançava, senti um olhar fixo que me observava com insistência, e foi então que a vi.
Ela estava sentada, aparentemente acompanhada por uma amiga, e decidi que na próxima música a convidaria para dançar. Assim foi: mal terminou a peça que dançava e antes que começasse a seguinte, dirigi-me até ela com passo seguro, o olhar firme, tentando antecipar-me a outros que talvez pensassem fazer o mesmo. O destino esteve do meu lado, e fui eu quem estendeu a mão primeiro e com o meu melhor sorriso, disse-lhe: Danças?
Ela aceitou sem hesitar.
Desde a primeira música experimentei um despertar estranho. A música não só marcava o ritmo, como acendia os meus sentidos. Não era uma dança qualquer. Os giros eram um jogo, as suas risadas um presente, e o seu corpo falava uma linguagem que a minha pele entendia sem tradução. Nos seus movimentos havia uma suavidade magnética, e nas suas mãos, uma firmeza quente que me transmitia calma e confiança.
Quando terminou a música, inclinei-me ao seu ouvido e, com voz tranquila, sussurrei:
— Adorei dançar contigo.
Senti que a frase, simples e honesta, percorreu-lhe a pele como um arrepio doce. Dançámos uma segunda música, depois uma terceira. Entre passos e giros foi-se tecendo um jogo de olhares e silêncios. Mal trocávamos palavras, mas a cumplicidade crescia como uma chama secreta.
No final da terceira música, decidimos parar de dançar e regressámos aos nossos lugares: ela com a sua amiga, eu sozinho. No entanto, procurávamo-nos de esguelha, com a timidez de quem sabe que foi tocado por um fio invisível. Passado um tempo, voltei a convidá-la. Ela aceitou, e dançámos mais três músicas. O roçar das nossas mãos tinha-se transformado num segredo partilhado, e os olhares diziam mais do que qualquer diálogo. Até que, entre risadas, ela confessou:
— Estou cheia de fome… se não comer depressa, vou ficar de mau humor.
Respondi com picardia:
— Então é melhor deixar-te ir, não quero ser a primeira vítima da tua fúria madrilenha.
Ela riu com aquela centelha sua e replicou:
— Talvez não seja má ideia!
Deixou-me sem palavras e com um sorriso tímido no rosto. Ambos rimos e, ao despedir-nos, perguntei-lhe o nome.
— Bárbara — disse, com uma intensidade que me arrepiou a pele.
Repeti o seu nome por dentro. Que nome tão desafiante e atrevido, reflexo de pura fúria contida, de um vulcão prestes a explodir. Trocámos contactos, dois beijos suaves na face e, entre eles, um roçar fugaz nos lábios, quase um suspiro de beijo, um selo que deixava aberta a promessa de algo que poderia acontecer… ou talvez nunca.
A decisão não estava no destino nem no universo, mas em nós. E essa incerteza tinha a sua própria magia. Afastei-me com o vazio da espera e ela com o meu contacto guardado no telemóvel. Só o tempo diria se aquele fio invisível voltaria a esticar-se… E aconteceu!!
Na quinta-feira começámos a trocar mensagens e combinámos encontrar-nos na sexta na Ermita, mas ela não apareceu; desculpou-se por mensagem, prometendo que me avisaria se pudesse ir no domingo. As horas seguiram entre mensagens breves, até que no sábado, Bárbara tomou a iniciativa e propôs um plano diferente: sair para passear por Madrid, talvez ir ao cinema.
Eu já tinha planos com amigos para regressar à Ermita nessa noite, mas cancelei-os em silêncio e não disse nada a ninguém. Sabia que tinha surgido algo mais importante. Combinámos encontrar-nos junto ao Urso e ao Medronheiro, na Puerta del Sol, entre as oito e as nove da noite.
E ali começou outra história. Uma que o universo decidiu escrever nesse instante: a primeira página de um relato que nenhum de nós planeava, mas que ambos precisávamos.
Madrid oferece-nos um passeio
O sábado amanheceu diferente. A cidade parecia sussurrar o meu nome, como se pressentisse que algo grande estava prestes a acontecer. Combinámos encontrar-nos no Sol, em frente ao Urso e ao Medronheiro, esse ponto onde milhões de passos se cruzam diariamente. E, no entanto, mal a vi, tive a certeza de que todo o bulício de Madrid se desfazia num murmúrio irrelevante.
Ela estava ali, radiante, natural, com aquela mistura de proximidade e mistério que a tornava irresistível. Ironicamente — ou talvez por algum capricho do destino — vestíamos com os mesmos tons: ela usava uma blusa e calças em castanho-claro, com sapatos pretos confortáveis; eu, uma t-shirt e calças soltas da mesma cor, também com sapatilhas pretas. A coincidência arrancou-nos uma risada cúmplice, como se o universo tivesse querido uniformizar-nos para nos reconhecermos.
Abraçámo-nos, cumprimentámos-nos e começámos a caminhar sem rumo, como se as próprias ruas se abrissem para nós. A conversa fluía leve, cheia de risos e de confissões veladas, enquanto Madrid se transformava num cenário cúmplice da nossa história nascente.
Chegámos à Almudena e sentámo-nos nas escadas, contemplando a vida a passar. O sol, já em retirada, banhava-lhe os cabelos com reflexos de fogo. Ela suspirou, olhando para o horizonte, e disse:
— Madrid tem algo especial.
Olhei-a com uma clareza que me surpreendeu a mim próprio.
— Não é Madrid… és tu.
Ela sorriu de forma brincalhona. Peguei-lhe nas mãos com suavidade e, entre sorrisos, disse-lhe:
— É melhor comeres alguma coisa antes que te cresçam presas e me devores…
Ela arqueou as sobrancelhas com picardia e respondeu:
— E se não fosse assim tão má ideia?
Ambos rimos, mas nos nossos olhares ardia algo mais do que brincadeira. Fomos jantar e a mesa transformou-se num palco íntimo de risos, de provocações e de carícias disfarçadas. Eu perdia-me na forma como ela me olhava, como se cada gesto meu fosse um enigma que desejava decifrar lentamente.
Sob a luz ténue da lua, inclinei-me e dei-lhe um beijo suave, intenso, um toque que suspendeu o mundo. Depois abracei-a com uma força genuína e, ao afastar-me, beijei-lhe a testa com uma ternura inesperada.
— Pareces o meu pai — disse ela, surpreendida, mas na sua expressão escondia-se um brilho de verdadeira doçura. Voltámos a beijar-nos, desta vez com a urgência de quem descobre um idioma novo. Caminhámos de mãos dadas, abraçados, embriagados pela magia inesperada que nos envolvia. Cada passo alimentava a ligação, os nossos corpos reclamavam mais, e a roupa começava a sentir-se como um obstáculo.
— Podemos ir para o meu apartamento — sugeri, entre risos.
Ela negou suavemente, com uma firmeza delicada:
— Não… procuremos um lugar mais neutro.
Não sabíamos para onde íamos, mas a noite, como cúmplice invisível, guiou-nos até um recanto escondido de um parque. Um espaço solitário, rodeado de árvores, que parecia esperar-nos desde sempre.
Ali sentámo-nos, beijámo-nos, tocámo-nos com a timidez ardente de quem deseja e teme ao mesmo tempo. O mundo desapareceu: não havia transeuntes, não havia ruído. Estávamos apenas nós, um refúgio invisível e a certeza de que aquela noite era um presente.
Parecia que o universo tinha decidido conspirar, como se esse refúgio secreto tivesse sido criado para selar um instante que jamais se repetiria. Um instante suspenso entre o proibido e o inevitável.
O Nosso Recanto do Parque
Naquele recanto escondido do parque, onde a noite parecia ter-se conspirado para nos oferecer um refúgio secreto, aconteceu o inevitável. Não houve pressa, foi como se o universo tivesse parado o tempo, concedendo-nos um espaço próprio onde mais ninguém existia.
Os nossos corpos começaram a aproximar-se com uma mistura de timidez e atrevimento, como se cada gesto estivesse a ser aprendido de novo. Ela olhou-me nos olhos, à procura de calma, e eu respondi com um leve sorriso, um gesto silencioso que dizia mais do que mil palavras: “estás segura, eu cuido de ti”.
Beijava-a com lentidão, primeiro apenas roçando-lhe os lábios, depois deixando-me levar por uma intensidade que crescia a cada instante. As minhas mãos percorriam a sua silhueta com suavidade, acariciando-a como se temesse quebrar uma porcelana sagrada. Ela, por sua vez, deixava-se levar entre tremores e risos nervosos, mas também com um desejo que crescia sem que pudesse contê-lo.
Num momento de coragem, ela tocou-me, e a surpresa deixou-a sem fôlego. Corou, olhou-me de novo e, aproximando a minha testa da dela, murmurei com ternura: Tranquila… prometo que vou cuidar de ti como da flor mais delicada do mundo.
Esse juramento silencioso foi suficiente para que ela se entregasse, não com a segurança habitual, mas com a inocência de quem volta a viver depois de muito tempo. Os nossos lábios procuravam-se sem descanso, as nossas respirações aceleravam-se e, pouco a pouco, a barreira da roupa deixou de fazer sentido, até ficarmos pele com pele, a tremer sob a sombra das árvores.
Acariciava-a devagar, erguendo por vezes a cabeça para me certificar de que ninguém nos descobria, mas voltando sempre a ela, aos seus olhos, ao seu sorriso que oscilava entre a picardia e a entrega. Quando finalmente os nossos corpos se uniram, ela olhou-me de frente, com uma mistura de medo e desejo. Não precisou de dizer nada: no seu olhar encontrei a resposta, e ofereci-lhe um “eu cuido de ti” pronunciado sem palavras.
O meu calor envolveu-a e, a cada movimento, sentia que não era apenas a sua pele que reagia, mas algo mais profundo, um lugar na alma que parecia despertar. Abraçava-a com força, mordia-lhe suavemente a pele e ela tentava conter o que sentia mordendo os lábios, porque não queria gritar. E, no entanto, o tremor do seu corpo denunciava-a: era um estremecimento que desconhecia, uma sensação tão intensa que chegou a acreditar que não a poderia suportar.
— Para… por favor, para… — murmurou, ofegante — sinto que vou morrer…
Parei de imediato, abracei-a com força e embalei-a contra o meu peito, enquanto lhe beijava a testa.
— Não te preocupes, estou aqui, contigo… vou sempre cuidar de ti.
Ela, ainda com os olhos abertos de surpresa, olhava-me sem compreender totalmente o que acabara de viver. Mas, no fundo, sabia: tinha sido único, mágico, algo que jamais havia sentido antes.
E, justamente nesse instante, a magia da noite foi interrompida por uma silhueta que se aproximava. Um homem, desconhecido, apareceu apressado, recolhendo umas malas escondidas perto do recanto. Ambos contivemos a respiração, vestimo-nos rapidamente, tentando recuperar a calma, e não conseguimos evitar rir nervosamente, não éramos os únicos que tinham descoberto aquele refúgio.
O susto, no entanto, transformou-se em cumplicidade. Olhámo-nos como dois culpados felizes por partilharem um segredo que só nós conhecíamos. Já de pé, abraçámo-nos com força e ela, algo dorida, pediu-me que caminhássemos devagar. Acompanhei-a, cuidando de cada passo, protegendo-a do mundo inteiro.
No caminho, comprámos uma garrafa de água num bar próximo. Olhavam para nós e ríamos como adolescentes, cúmplices de um instante roubado ao destino. A noite, ainda quente, guiou-nos até à surpresa de um detalhe… tínhamos chegado perto da Ermita. O local estava já em silêncio, vazio, mas a coincidência pareceu-nos um aceno do destino, um lembrete de que tudo tinha começado ali.
Por fim, chegámos ao metro de Príncipe Pío. Abraçámo-nos com força, trocámos um último beijo demorado, desses que se sentem mais como promessa do que como despedida, e combinámos avisar-nos ao chegar a casa.
E assim foi. Adormeci com a sensação de ter vivido uma noite impossível de repetir, com o coração a bater mais forte do que nunca, guardando em silêncio uma memória que me marcaria para sempre.
Uma agradável surpresa
O domingo tinha sido estranho para mim. Estive na Ermita, convencido de que devia manter o meu propósito de dançar para evoluir, dançar para viver essa arte que tanto me movia. Mas não era o mesmo. Entre uma música e outra, a pista parecia-me mais vazia, mais fria, como se faltasse uma centelha que tinha marcado o meu corpo e a minha alma da última vez. Esforcei-me por sair, rodar, perder-me nos compassos, mas no fundo de mim sabia que a sentia falta.
Já em casa, vencido pelo cansaço, deixei-me cair na cama. E, justo quando me rendia ao sono, uma notificação iluminou o telemóvel. Era dela:
— Boa noite… importas-te que nos vejamos amanhã, segunda-feira, no mesmo lugar?
Sorri e respondi com entusiasmo contido. Ela prometeu uma surpresa. E eu ri sozinho, pensando que não havia maior surpresa do que voltar a vê-la.
A segunda-feira chegou carregada de ansiedade e emoção. Às 20:00 em ponto, encontrei-a à minha espera no VIPs de Sol. Ela, com aquele encanto natural, saboreava um gelado de chocolate acompanhado de um sumo de laranja. Sentei-me à sua frente e, entre risos e gestos, partilhámos a merenda como dois cúmplices que pareciam conhecer-se desde sempre.
Depois caminhámos pela Gran Vía, sob as luzes da cidade que começavam a acender-se. Entre montras e turistas, ela olhou-me com uma picardia brincalhona e perguntou:
— Queres repetir o de sábado?
Abracei-a com ternura e, com um sorriso poético e maroto, respondi:
— Só se me prometeres que desta vez o céu não nos castigará com estrelas a mais… porque não saberia escolher: as que brilham lá em cima ou as que guardas nos teus olhos.
Ela riu espontaneamente e replicou:
— És um desastre… um desastre encantador!
Seguimos o passeio até entrarmos numa igreja. Ela aproximou-se de uma pequena caixa de velas, lançou uma moeda, fechou os olhos por um instante e, ao voltar-se para mim, disse com fingida solenidade:
— Fiz um pedido.
— E pode-se saber qual? — perguntei.
Mordendo os lábios, respondeu entre risos:
— Pedi que sejas um homem melhor… e que voltes a ser dos bons, porque tu de certeza és dos maus…
Rimo-nos às gargalhadas, e a cumplicidade tornou-se ainda mais forte. Ao sairmos, ela segurou-me a mão com firmeza e guiou-me até a uma pensão ali perto.
— Queres descansar um pouco? — sussurrou, com aquela mistura de inocência e ousadia que tanto me desconcertava. E quando dei por mim, já estávamos dentro do quarto.
Abracei-a, beijei-a com desejo contido, e pouco a pouco o jogo transformou-se em incêndio. Ela estremecia a cada mordida suave, a cada carícia lenta. Quando lentamente tirei a camisa, ficou muda, olhando-me como quem contempla uma obra de arte — admirando o corpo, as mãos, a força e a delicadeza fundidas numa só presença. E eu, por minha vez, contemplava-a como se fosse irreal, como se não pertencesse a este mundo.
Então… beijei-lhe os lábios com uma lentidão calculada, descendo depois pelo pescoço, pelos ombros, por cada curva que se oferecia às minhas mãos e à minha boca. Os meus dedos exploravam com devoção a delicadeza da sua pele, enquanto os lábios traçavam um mapa ardente, sem deixar um canto por descobrir. A sua respiração acelerava-se, o corpo vibrava em doces tremores, incapaz de conter a maré que a percorria.
O seu peito erguia-se contra as minhas carícias e ouvi-a gemer o meu nome como se fosse um segredo demasiado grande para guardar. Todo o seu corpo falava, tremia, arqueava-se, rendia-se. Até que a emoção a rompeu num estoiro de sensações que a deixou sem fôlego. Eu continuava ali, pintando na sua pele a música do nosso encontro.
Ainda ofegante, mal teve tempo de recuperar a calma quando outra onda a surpreendeu. A sua voz, trémula, rogou-me com uma doçura desarmante:
— Pára… por favor… não aguento mais… o meu corpo treme… estou aturdida…
Abracei-a com ternura, assegurando-lhe que tudo estava bem, que o que ela sentia era mais do que suficiente. Ficámos abraçados longamente, até irmos juntos ao duche, onde, nesse gesto simples, partilhámos talvez o momento mais íntimo de todos: a calma depois do furacão.
Ao vestir-se, olhou-me com certa nostalgia e disse:
— Gostava de passar a noite contigo… mas não posso.
Longe de recriminar, acariciei-lhe a face e sorri com serenidade.
— Está bem… vamos sair para comer algo.
Assim fizemos, caminhando sob as luzes de Madrid, com o aroma da noite e o murmúrio da cidade. Encontrámos um pequeno lugar aberto, partilhámos um prato simples e rimos como se o tempo não existisse. Não havia cansaço capaz de apagar a magia do vivido.
Nessa noite, ao despedimo-nos, cada um guardou em silêncio a certeza de que, mais além do que pudesse acontecer, o que vivêramos era um presente único, uma história que ficaria gravada em nós para sempre.
Uma despedida inesperada
Tudo aconteceu em apenas uma semana. Começou numa terça-feira qualquer e terminou ao cair da segunda seguinte. Nesse curto espaço, cada instante partilhado parecia multiplicar-se em intensidade, como se o tempo tivesse decidido esticar-se para nos oferecer uma eternidade escondida em poucos dias.
No fim, ela confessou-me a verdade: tinha namorado. Escutei-a em silêncio, sem reproches nem dramas. Limitei-me a olhá-la com calma, como quem sabe que as coisas importantes não se forçam. E embora me tivesse doído, não hesitei em deixá-la ir com respeito. Disse-lhe suavemente para não se preocupar, que nunca a julgaria, que sempre honraria o que tínhamos vivido.
Ela acreditava que eu me tinha apaixonado, porque em todo o tempo fui genuíno, intenso, entregando a minha melhor versão como se tivesse encontrado a mulher da minha vida. Mas talvez não entendesse que, embora eu expresse as minhas emoções sem medo, também sei que nada deve ser aprisionado. Que às vezes a verdadeira beleza está em deixar as coisas fluírem, mesmo que o fim chegue mais cedo do que o esperado.
Com voz baixa, ela repetiu:
— Não quero magoar-te…
Não respondi. Sorri com ternura e guardei silêncio. Não quis pensar demasiado, apenas agradecer pelo lindo momento que a vida me tinha oferecido. Seria capricho do universo manter-nos separados? Ou simplesmente cada um merecia outro caminho, outro destino? Isso ficaria sempre como incógnita.
Um olhar breve, carregado de nostalgia, como uma melodia doce mas com eco de despedida. Os dois sabíamos que o que partilháramos era autêntico, breve e impossível de esquecer. Despedimo-nos com ternura, sem promessas, apenas com a vaga ideia de que talvez, um dia, nos reencontrássemos na Ermita. Mas nenhum quis dar certeza a essa promessa; sabíamos que há palavras que é melhor deixar abertas, como uma porta que talvez, com o tempo, o destino decida atravessar.
Ela deu-me um beijo e um abraço forte, depois virou-me as costas e foi-se embora.
Vi-a afastar-se e, enquanto caminhava para o metro, sem poder conter-me, uma lágrima escapou-me. Nunca soube se era de alegria por ter vivido algo tão bonito ou de tristeza por estar a perder algo que mal tinha começado. O que sabia com clareza era que jamais a esqueceria. Aquela semana tinha-se tornado um tesouro, um presente inesperado da vida.
Separámo-nos sem rancores, com um carinho sincero a flutuar no ar. E embora a vida nos tivesse levado por caminhos diferentes, sei que ela ainda recorda o brilho dos meus olhos, a risa cúmplice na Gran Vía e aquele beijo que teve sabor de despedida e eternidade ao mesmo tempo. Porque há encontros que, mesmo sem durar, ficam tatuados na memória para sempre.
Uma mensagem que surpreende
Passaram semanas e o silêncio parecia ter selado aquela história. Ela tinha-me dito que não queria magoar-me, que era melhor deixar tudo ali. E eu aceitei, com gratidão e uma certa tristeza, guardando aquele dia como um capítulo único na minha memória. Depois daquela despedida, pensei que a nossa história tinha chegado ao fim. Ela tinha sido clara, não queria ferir-me e o melhor era seguirmos caminhos distintos. Mas a vida, caprichosa como sempre, tinha outro plano.
Era um sábado especial, tinha passado todo o dia com o meu sobrinho e a namorada dele, que tinham vindo de Burgos visitar-me. Partilhámos um dia maravilhoso, cheio de risos e momentos simples, e eu, completamente entregue à sua companhia, mantivera-me desligado do telemóvel.
Já em casa, por volta das sete da tarde, liguei o telefone e vi uma mensagem no WhatsApp que tinha chegado uma hora antes. Era da Bárbara! Que, com naturalidade, como se nada tivesse acontecido, perguntava-me: O que te pareceria se nos encontrássemos hoje?
Confesso que não estava nada à espera. Surpreendeu-me e, ao mesmo tempo, deixou-me feliz. Talvez tivesse refletido, talvez tivesse descoberto que ainda queria partilhar algo mais comigo. Não sei.
Com emoção, mas tentando manter alguma calma, olhei para a hora e respondi-lhe que estava um pouco atrasado, pois ainda tinha de me lavar e preparar antes de sair. Ela, com aquele tom maroto e provocador que tanto a caracteriza, respondeu:
– Latino pretensioso…
E acrescentou que o melhor era ir até onde eu estava e assim, sem grandes voltas, combinámos encontrar-nos perto da boca do metro da minha casa.
Essa sua linha bastou para derrubar as paredes que tinha tentado construir. Se me escrevia, era porque algo dentro dela também pedia um reencontro. E eu, que tinha tentado convencer-me de que tudo tinha terminado, compreendi que ainda nos esperava uma última página por escrever. Um capítulo distinto, inesperado, como se o destino, caprichoso e brincalhão, tivesse decidido que a nossa história ainda não estava terminada.
A nossa atuação no cinema
Depois de várias mensagens trocadas pelo WhatsApp, onde nas entrelinhas se sentia essa curiosidade de nos voltarmos a ver, combinámos encontrar-nos na boca do metro, perto da minha casa. Antes de sair, tomei um duche longo e, enquanto a água corria pelo meu corpo, não conseguia afastar da mente a pergunta sobre o que traria este encontro. O que queria dizer-me? O que queria mostrar-me? Por momentos deixei-me levar pela inquietação, mas depois lembrei-me de que não havia nada com que me preocupar, a minha consciência estava tranquila, limpa, leve.
Ao terminar de me arranjar, vesti-me sem pressas, respirei fundo e saí de casa em direção ao metro. Levava os auriculares postos, deixando que a música me acompanhasse como pano de fundo, mas na verdade os meus pensamentos estavam nela. A cada passo, imaginava-a, até que, ao aproximar-me, vi-a de verdade. Lá estava, sentada, concentrada no telemóvel, com aquele ar natural que tanto me atraía.
Usava umas calças azul-escuro de tecido leve e uma blusa clara que, sob a luz suave do entardecer, parecia branca. Estava linda, com aquele sorriso que não pede licença para brilhar e aquele cabelo semi-ondulado, negro intenso, que parecia guardar um segredo em cada madeixa. Olhei-a sem disfarçar e com entrega. Quando me viu, levantou-se de imediato. Nesse instante, uma alegria pura percorreu-me o corpo, e agradeci-lhe de coração por ter tido a iniciativa de me escrever para nos encontrarmos. Estendi os braços e ela deixou-se envolver no meu peito e no meu abraço: longo, forte, cheio da certeza de que ambos queríamos estar ali. Desde esse primeiro instante soube que aquele dia não seria como os outros.
Começámos a falar do quotidiano, do trabalho, de como estávamos, de alguma piada leve — e pouco a pouco o ambiente encheu-se de naturalidade. Como tínhamos combinado ir ao cinema, ela verificou no telemóvel os filmes em cartaz e escolheu um; eu deixei que fosse assim, porque adoro cinema em todas as suas formas, e vê-la decidir já era em si um pequeno espetáculo que eu saboreava em silêncio.
Caminhámos juntos e, a meio do caminho, parámos e entrámos num bar muito bonito, mas estava cheio, então decidimos sair e desfrutar de um ambiente aberto. Procurámos um espaço que pudéssemos partilhar, eu tirei um chocolate da minha terra e ofereci-lho, melhor dito, ela partilhou-o comigo, pois fui eu que lhe ofereci esse pequeno chocolate. A ela agradou-lhe e eu fiquei feliz. Ali sentados bebemos água que ela trazia na mochila, falámos com mais profundidade nesse instante, partilhámos coisas, e ela falou-me com sotaque catalão e fez-me rir, e ela ria-se também por me fazer rir. Foi bonito partilhar sorrisos com ela. Depois de estarmos ali, lembrámo-nos de que tínhamos de ir ao cinema e fomos apanhar o autocarro para chegar mais depressa.
Com ela tudo é um aprendizado, porque tem o dom de partilhar o que sabe, e ouvi-la é para mim magnético. Chegámos ao cinema, resolvemos um pequeno mal-entendido com os bilhetes e comprámos outros novos, comprámos umas pipocas e ela, com aquela doçura firme que a caracteriza, lembrou-me para ir à casa de banho antes de entrar. Disse-o com um tom tão engraçado que não consegui evitar pensar numa mãe carinhosa a cuidar do filho… e ri-me, porque na verdade havia ternura por detrás desse gesto.
Já com tudo pronto, caminhámos de mãos dadas para a sala. Esse gesto simples — ir de mãos dadas como um casal — enchia-me de surpresa e de calma ao mesmo tempo. Quis entender o que ela esperava, o que procurava, mas decidi rapidamente deixar de pensar e apenas viver o momento, senti-la, desfrutar da sua companhia sem perguntas nem pressas.
As conversas, os olhares cúmplices, os silêncios carregados de desejo foram-nos envolvendo. A Bárbara não é mulher de se expor em público; tem a elegância de se resguardar, de não ceder a cenas ousadas perante desconhecidos. E eu respeito isso, porque fala de alguém que sabe valorizar-se.
Dentro do cinema escolhemos um canto recatado, lá em cima, longe dos olhares, e uma vez sentados começou a nossa própria trama. O filme, que também começava, não prendia a nossa atenção. Tanto a minha como a dela estavam focadas noutros detalhes. Seguiu-se um beijo intenso, profundo, que despertou sensações na minha alma, sensações que acenderam cada recanto do meu corpo.
As minhas mãos percorreram o seu rosto, os seus lábios, meio mordidos, pediam-me mais, e a distância entre os assentos lembrava-nos de que estávamos num espaço público, o que acrescentava um encanto secreto. Ela pousou as suas delicadas mãos sobre a minha entreperna, firmes mas suaves, como se reclamasse algo que já lhe pertencia desde sempre. E a verdade é que tinha razão, nesse instante todo o meu corpo, cada batida, cada desejo, era dela. Não havia espaço para dúvidas, apenas a certeza de que me entregava sem reservas.
Respondi com carícias lentas, como se as minhas mãos escrevessem um mapa secreto sobre a sua pele. Cada curva, cada linha do seu corpo era um território novo, e eu percorria-o com respeito, mas também com uma fome contida. Os meus dedos roçavam a sua pele e subiam até aos seus seios, onde se detinham para saborear a firmeza que se erguia sob a roupa. Os seus mamilos reagiam ao contacto, endurecendo-se com uma rapidez deliciosa, como se me convidassem a mais.
O ângulo não me permitia juntar os meus lábios a eles como desejava com toda a alma, mas contemplá-los, tensos e entregues às minhas mãos, era um prazer em si mesmo. Fascinava-me ver como a sua respiração se agitava ao compasso das minhas carícias, como fechava os olhos por instantes e os voltava a abrir com um brilho húmido, como se procurasse nos meus olhos permissão para se perder.
Não consegui deter-me. Desci lentamente com os meus dedos, desenhando um caminho desde os seios até ao ventre, um percurso carregado de fogo que parecia acender-se a cada toque. Até que finalmente cheguei a esse lugar íntimo onde já não havia dúvidas: estava húmida, quente, completamente desperta ao meu contacto. Esse calor envolveu-me como uma confissão silenciosa, como se o seu corpo me dissesse o que os seus lábios ainda não se atreviam a pronunciar… Continua…!!
Os meus dedos começaram a mover-se com suavidade, explorando os recantos do seu desejo, acariciando com precisão, escutando com atenção cada gemido contido, cada suspiro que escapava entre os seus lábios mordidos. Sentia como as suas pernas se contraíam em volta da minha mão, como me apertava os braços, ora com a urgência de pedir mais, ora com a ternura de me pedir calma. Até que, de repente, senti o seu corpo arquear-se, as pernas tremerem como se um raio a atravessasse, e as suas mãos cravarem-se com força nos meus braços, a conter um grito que não se permitiu soltar.
O silêncio foi o seu único desabafo, um gemido abafado que guardou com zelo para não chamar a atenção de ninguém. Pediu-me que parasse, que estava demasiado sensível… e eu parei. Não precisava de mais. Vê-la desfrutar, vê-la transbordar prazer nas minhas mãos, era e é o que mais me preenche. Senti que me alimentava da sua energia, que me carregava até ao limite. Podia ter continuado a percorrer cada recanto do seu corpo com os meus lábios, a beijar cada curva, a deleitar-me com o perfume que exalava a sua feminilidade.
E eu entendi-a. Cuidei dela. Sustive-a nesse instante em que o prazer e a vulnerabilidade se entrelaçam. Abracei-a forte, beijei-a devagar, como quem promete sem palavras, e murmurei-lhe ao ouvido que estaria sempre segura comigo.
Ela abriu os olhos, brilhantes e húmidos, e com uma doçura desarmante agradeceu-me. O beijo que me deu depois foi diferente, profundo, lento, carregado de entrega. Um dos mais doces que recebi na minha vida. Porque não nasceu apenas do desejo do corpo, mas da alma… e esse tipo de beijos ficam tatuados para sempre. Depois, com uma mistura de ternura e malícia, disse-me entre risos:
— Estás pronto para te vestires antes que acendam as luzes? O filme está quase a acabar…
Não a deixei terminar. Vesti-me rapidamente, sorri e disse-lhe:
— Sim… e tu?
Ela, mais lenta, com aquela graça que a tornava única, riu-se e começou a vestir-se. Quando terminámos, as luzes acenderam-se, iluminando a sala com uma clareza que parecia denunciar tudo… menos o que era nosso. Só nós entendíamos o que ali tinha acontecido. Era um segredo partilhado, guardado no cofre invisível das nossas memórias.
Saímos juntos, e o cinema estava já fechado, como se o mundo nos tivesse esperado a sós. Não sabia a hora exata, mas devia ser perto da meia-noite. Caminhámos até à saída e encontrámos a lua, enorme e avermelhada, que nos acompanhava lá do alto. Detivemo-nos um momento para a admirar; parecia sorrir-nos, abençoar o nosso encontro e, ao mesmo tempo, advertir-nos de que nada estava garantido.
Ao chegar ao metro, ela embarcou. Despedimo-nos com um beijo longo, intenso, que não prometia nada, mas dizia tudo.
Respirei fundo. Agradeci ao universo por aquele instante irrepetível. Virei-me, caminhei em silêncio até aos meus aposentos. Nessa noite adormeci a pensar nela, a desejar-lhe o melhor, sabendo que já não éramos donos do que viria. Porque, por vezes, o amor, o desejo e o destino encontram-se apenas uma vez e, depois… só o universo decide se nos concede a graça de um reencontro.
E assim percebi que nunca sabemos que dia se tornará inesquecível… para mim, aquele sábado que começou às sete da tarde transformou-se num dos mais belos capítulos da minha vida.