Entre o Amante que Fui e o que Quero Ser

Este texto é um retrato honesto e sem artifícios do meu mapa íntimo. Embora não revele pormenores explícitos, procura oferecer uma visão clara de quem fui, de quem sou e de quem aspiro ser. É a história — pessoal e interrogativa — de como a curiosidade se transformou em descoberta, a descoberta em prática, e a prática em aprendizagem consciente. Não procuro desculpas nem medalhas; procuro a verdade nua que me constrói — não uma verdade acabada, mas aquela que continua a ser moldada em cada encontro, em cada leitura, em cada experiência que me convida a aprender e reaprender.

Cresci rodeado de fragmentos. Como acontece com a maioria das pessoas, o universo da sexualidade abriu-se para mim aos bocados, sem manuais, sem mapas claros — apenas pistas espalhadas por quem me rodeava. Cada comentário, cada olhar trocado, cada silêncio pesado caiu na gaveta das coisas proibidas de falar e alimentou uma inquietação que não se calava.

Recordo-me, ainda, das noites em que, já deitado, percebia sons e movimentos vindos do quarto dos meus pais — sinais que eu não sabia decifrar naquela altura e que anos depois comecei a interpretar. Essas memórias não são sensações isoladas; são atalhos que me ensinaram a observar, a escutar e a procurar significado em migalhas de informação. Hoje chamaria isso “vigilância íntima”: um sentido atento a qualquer pista que ajudasse a compreender o desejo, a intimidade e as regras não escritas dos relacionamentos.

A minha primeira experiência sexual foi precoce e aconteceu com uma mulher significativamente mais velha do que eu. Foi marcante, formativa e, ao mesmo tempo, complexa. Hoje reconheço a assimetria de poder e as questões de consentimento que a envolvem; prefiro não detalhar momentos íntimos, mas não apago a influência que aquilo teve na minha construção emocional e erótica. Essa experiência abriu em mim uma atração por mulheres maduras — por aquilo que traziam de experiência, cuidado e presença — e deixou modelos de afetividade que mais tarde me serviriam de referência.

Com a idade, aproximei-me de pessoas da minha faixa etária e essas relações tiveram outra cor: mais fáceis, por vezes mais rotineiras, menos pedagógicas. Confesso que, por um período, o meu sentido de virilidade confundiu-se com a quantidade de conquistas; julguei que levar mulheres para a cama era sinónimo de ser bom amante. Esse comportamento trouxe-me a revelação amarga de que, durante muito tempo, fui egoísta — preocupado sobretudo com o meu prazer e pouco atento ao prazer alheio.

Depois de muitos anos e, já após o meu segundo divórcio, optei por um ano de celibato. Foi um período de silêncio imposto que me obrigou a olhar para dentro. Nesse recuo, a clareza foi dura: percebi que havia lacunas — técnicas, linguagem emocional, comunicação e uma noção ética do encontro que eu não possuía. Aceitar essa ignorância foi o primeiro gesto de coragem.

Procurei então informação: entre livros, artigos, tutoriais online e conversas francas com mulheres que cruzaram o meu caminho, comecei um processo deliberado de auto educação sexual. Como acontece com tantos homens, esbarrei em vídeos de «gurus da sedução» e em fórmulas fáceis que prometiam resultados rápidos — mas raramente falavam de intimidade, consentimento ou do prazer feminino. Curiosamente, encontrei força e honestidade em conteúdos produzidos por mulheres, e sobretudo em diálogos sérios e profundos que me ensinaram mais do que qualquer truque.

A aprendizagem prática foi sendo conjugada com leituras e reflexões; a teoria entrou na vida real e vice-versa. Aprendi que o prazer se organiza em três eixos inseparáveis: corpo, mente e espírito. Um encontro pleno exige presença mental — atenção sem distrações —, cuidado físico — saúde e preparação corporal — e um eixo ético-espiritual que dignifique o outro. Trabalhar estes três polos transformou a minha forma de estar com uma mulher: o desejo deixou de ser um impulso cego e passou a ser uma escolha consciente, comunicada e consentida.

Não me considero um especialista; considero-me um aprendiz empenhado. A minha prática partilha raízes com a educação sexual, a terapia sexual e o auto conhecimento — palavras-chave que orientaram a minha busca: intimidade, prazer feminino, comunicação erótica, consentimento, empatia, relacionamentos íntimos e auto educação sexual.

Partilho este relato com humildade e sem juízos de valor. Não pretendo ditar normas, apenas descrever como fui edificando a minha intimidade: aceitando que não se sabe, aprendendo a perguntar, praticando com responsabilidade e reconhecendo que cada corpo é um território singular. O que funcionou comigo pode não funcionar com outro; por isso a escuta, o diálogo e a ética são sempre o ponto de partida.

Agradeço a todas as mulheres, porque todas elas me ensinaram sempre algo novo — direta ou indiretamente — e a mim próprio, por continuar a procurar, dia após dia, entender o que significa ser um amante atento, responsável e humano.

Este é apenas o início. Numa segunda parte, quero falar das conversas que mudaram a minha visão do sexo e me deram novas chaves para ter um ré-encontro constante com a minha sexualidade. Personagens improváveis que marcaram o meu caminho: raparigas jovens e mulheres mais velhas, prostitutas e escritoras, pessoas comuns e até aquelas que viveram a experiência da prisão. Vozes diversas que, cada uma à sua maneira, deixaram sementes que continuam a germinar dentro de mim.

“Quem não aprende com a vida, repete os mesmos erros no amor”

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